Trata da banalização na aplicação de Indenizações por Danos Morais no país
O direito do consumidor está presente no dia a dia de todos, vez
que, ao vivermos em sociedade, aprimoramos as técnicas do antigo método de
escambo (trocas de mercadorias), para o atual comércio, onde foi designado um
valor à moeda corrente, e esta é utilizada para valoração de um determinado produto
ou serviço.
Assim, as pessoas passaram a agregar riquezas, quer financeiras
ou patrimoniais, sempre voltadas para capitalizar o valor investido e dar
retorno ao titular sob o ideal de uma ordem justa, que, na expressão de Hans
Kelsen em sua obra “O que é Justiça” (Tradução Luís Carlos Borges, 3ª ed. São
Paulo, editora Martins Fontes, 2001, p. 2, "significa essa ordem
regular o comportamento dos homens de modo a contentar a todos, e todos
encontrarem sob ela felicidade. O anseio por justiça é o eterno anseio do homem
por felicidade. Não podendo encontrá-la como indivíduo isolado, procura essa
felicidade dentro da sociedade. Justiça é felicidade social, é a felicidade
garantida por uma ordem social. Nesse sentido Platão identifica justiça a
felicidade, quando afirma que só o justo é feliz e o injusto, infeliz".
No passado, fazer valer um direito era algo praticamente
inatingível, ou, na maioria dos casos, economicamente inviável, o que foi
modificado pela criação dos Juizados Especiais (1995), que facilitou ao cidadão
exercer seu direito e buscar a prestação jurisdicional para intermediar os
conflitos de menores complexidades, dirimindo-os sem o maior elastério e de
forma rápida e eficaz.
Para Noberto Bobbio, in "A Era dos Direitos",
Editora Campus, pg. 15, "O problema do fundamento de um direito
apresenta-se diferentemente conforme se trate de buscar o fundamento de um
direito que se tem ou de um direito que se gostaria de ter."
Consoante o crescimento das atividades comerciais /
empresariais, houve a elevação da busca da prestação jurisdicional que,
fomentado pela facilidade no ajuizamento de ações, inclusive sem a necessidade
de advogado, passou a fazer parte do cotidiano do consumidor.
Ocorre que a facilidade do acesso ao Judiciário fomentou uma
busca incessante por direitos que, muita das vezes, não condizem com a
pretensão legal instituída, gerando o enriquecimento ilícito em detrimento das
empresas sucumbentes, o que foi denominado, frivolamente, de “indústria do dano
moral”.
Essa denominada “indústria do dano moral” trouxe à vida prática
dos operadores de direito, sejam advogados ou mesmo magistrados, temores para a
quantificação do dano moral, pois, cada vez mais fica evidente a
desproporcionalidade entre o fato concreto e o valor indenizatório pleiteado,
atraindo pessoas sem o conhecimento específico como uma loteria de apostas.
Por outro lado, esse crescente fluxo de ações que objetivam
indenizações por danos morais prejudicaram os legítimos titulares do direito,
vez que, nos casos em que certamente a parte comprova ter sofrido um dano, fica
generalizada a quantificação da indenização pela rotineira aplicação em casos
semelhantes.
Mas, mesmo assim, tal como lecionou Anatole France sobre a
postura do Magistrado na área da interpretação do direito, disse que "Não
se deve ter medo das más leis se elas forem aplicadas por bons juizes. Não há
texto de lei que não deixe campo à interpretação. A lei é morta e o magistrado
vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela."
Para as empresas, essa indústria apesar de acarretar prejuízos
incalculáveis, geram duas consequências: decretação de insolvência ou repasse
desse ônus aos consumidores, inflacionando cada vez mais o mercado.
Fugindo às regras sociais e morais, é evidente que alguns
operadores do direito pedem e alguns magistrados têm cedido a tais pleitos
exacerbados, instigando essa maliciosa expressão. O Estado tem de estar atento
às situações de forma individualizadas e não como conjunto pejorativo. Miguel
Reale a respeito de regras, em sua obra Lições Preliminares de Direito, ed.
Butshasky, 1973, p. 154, lecionou que “O Estado não subsistiria, nem a
sociedade poderia lograr seus fins, se não existissem certas regras dotadas de
conteúdo estável, cuja obrigatoriedade não fosse insuscetível de alteração pela
vontade dos obrigados.”
A era do direito romântico passou. Estamos na modernidade e os
sintomas estão aparecendo de quando em quando e de forma desrespeitosa para
alguns. A sociedade em que vivemos é um simples reflexo dos atos que
praticamos, faltando a consciência dos cidadãos para buscarem apenas os
direitos legalmente instituídos, sendo a única saída para reformulação do ciclo
vicioso atual e nos faz lembrar Antoine Saint-Exupery, autor do Pequeno
Príncipe: “O sorriso do irreparável gelou-me de novo. E eu compreendi que não
podia suportar a idéia de nunca mais escutar esse sorriso. Ele era para mim
como uma fonte no deserto”.
Desse modo, ouso discordar da expressão “indústria do dano
moral”, tão usada nos dias de hoje pela imprensa ou por aqueles que pretendem
macular a tão dignificante profissão advocatícia. Não devemos garantir que o
mal está ai porque dele usará quem não tiver consciência social e moral.
Roberto L. P. B.
Gonçalves (OAB/MA n° 8400)
Adalberto R. B.
Gonçalves (OAB/MA n° 973)
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