Quarta-feira, 01 de agosto de 2012
Durante a sessão
plenária desta quarta-feira (1º), o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF)
manteve, por maioria dos votos, entendimento do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) no sentido de que se torna inelegível para o cargo de
prefeito cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos na chefia de executivo
municipal, mesmo que pleiteie candidatura em município diferente. Os
ministros reconheceram que essa questão constitucional tem repercussão geral.
A questão foi
analisada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE 637485) interposto por
Vicente de Paula de Souza Guedes contra acórdão do TSE que confirmou decisão de
cassar o diploma dos candidatos eleitos para os cargos de prefeito e
vice-prefeita do município de Valença (RJ), no pleito de 2008. Por decisão
majoritária, os ministros deram provimento ao recurso, ao entender que TSE
poderia ter modificado antiga jurisprudência sobre a matéria, mas, para isso,
deveria modular os efeitos da decisão, por motivo de segurança jurídica.
O exame do RE
promoveu discussão sobre a possibilidade de prefeito reeleito para um
determinado município transferir seu domicílio eleitoral e concorrer ao cargo
de prefeito em município diverso e, assim, caracterizar o exercício de um
terceiro mandato, situação na qual poderia ser aplicada inelegibilidade
prevista no artigo 14, parágrafo 5º, da Constituição Federal. Tal hipótese foi
chamada pela jurisprudência do TSE de “prefeito itinerante” ou “prefeito
profissional”.
Vicente exerceu
cargo de prefeito do município de Rio das Flores (RJ) por dois mandados
consecutivos (2000-2004 e 2004-2008) e, posteriormente, candidatou-se e
elegeu-se, no pleito de 2008, prefeito de Valença (RJ), o que motivou a
proposição de recurso pela coligação adversária contra expedição de diploma
eleitoral. O Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) negou
provimento ao recurso. Porém, o TSE, ao analisar a matéria em recurso especial,
cassou o diploma do candidato eleito e de sua vice.
No RE interposto ao Supremo, os advogados do recorrente sustentam que o acórdão questionado violou a norma do artigo 14, parágrafos 5º e 6º, e do artigo 5º, caput, da Constituição Federal. Alegam que o acórdão contestado não fez a necessária distinção entre reeleição de mesmo cargo com reeleição para cargo de mesma natureza e que “a surpreendente alteração de jurisprudência ocorrida depois da eleição realizada afeta, de forma evidente, o princípio da segurança jurídica, porquanto frustra a possibilidade de o indivíduo ter previsão das consequências do ato a ser praticado”.
No RE interposto ao Supremo, os advogados do recorrente sustentam que o acórdão questionado violou a norma do artigo 14, parágrafos 5º e 6º, e do artigo 5º, caput, da Constituição Federal. Alegam que o acórdão contestado não fez a necessária distinção entre reeleição de mesmo cargo com reeleição para cargo de mesma natureza e que “a surpreendente alteração de jurisprudência ocorrida depois da eleição realizada afeta, de forma evidente, o princípio da segurança jurídica, porquanto frustra a possibilidade de o indivíduo ter previsão das consequências do ato a ser praticado”.
Segundo a defesa do
prefeito, a proibição para o exercício de mais de dois mandatos consecutivos
decorre do princípio democrático da alternância de poder, a fim de evitar a
perpetuação de mesmo grupo político à frente da administração de determinada
localidade. Porém, argumenta que novo mandato em município diverso ao anterior
não encontra óbice no conceito de reeleição.
Mudança de
jurisprudência
Anteriormente, o
Tribunal Superior Eleitoral entendia que o prefeito reeleito em determinado
município podia candidatar-se ao mesmo cargo em outro município, observados os
prazos de desincompatibilização, domicílio eleitoral e filiação partidária. Nas
eleições de 2008, entretanto, o TSE alterou sua orientação ao julgar o Recurso
Especial Eleitoral (Respe) 32507, em que se firmou o entendimento de que o
artigo 14, parágrafo 5º, da CF veda a perpetuação no cargo, não sendo possível
o exercício de um terceiro mandato subsequente, ainda que em município diverso.
Segurança Jurídica
O relator do
processo, ministro Gilmar Mendes, deu provimento ao recurso extraordinário e
reconheceu que ao caso incide o instituto da repercussão geral. Para ele, a
alteração de jurisprudência realizada pelo TSE em dezembro de 2008 – período da
diplomação dos eleitos – poderia ter ocorrido, mas, ao fazê-lo, não foi
observado o princípio da segurança jurídica. Por esse motivo, o ministro
entendeu que houve lesão.
De acordo com o
relator, houve regular registro da candidatura, bem como legítima participação
e vitória do candidato no pleito, tudo conforme as regras então vigentes e a sua
interpretação pela justiça eleitoral. “As circunstâncias levam a crer que a
alteração repentina e radical dessas regras, uma vez o período eleitoral já
praticamente encerrado, repercute drasticamente na ideia de segurança jurídica
que deve nortear o processo eleitoral, mas especificamente na confiança do
candidato e do cidadão eleitor”, afirmou.
O ministro Gilmar
Mendes observou que em hipóteses de alteração de jurisprudência de longa data,
“parece sensato considerar seriamente a necessidade de se modularem os efeitos
da decisão, com base em razões de segurança jurídica”. Ele comentou que essa
tem sido a praxe do Supremo quando há modificação radical da jurisprudência.
O princípio da
anterioridade eleitoral, previsto no artigo 16 da CF, também foi citado pelo
relator. Ele afirmou que a mudança de jurisprudência do TSE está submetida a
esse princípio, “de modo que seus efeitos somente podem valer para as eleições
que se realizarem até um ano da data da sua prolação”.
Eficácia
prospectiva
No caso concreto, o
ministro Gilmar Mendes avaliou que apesar de ter entendido ser inelegível para
o cargo de prefeito cidadão que exerceu por dois mandatos consecutivos cargo da
mesma natureza em município diverso, a decisão do TSE não pode retroagir para
incidir sobre diploma regularmente concedido ao autor do RE, vencedor das
eleições de 2008 para a prefeitura de Valença (RJ).
Dessa forma, o
relator entendeu que as decisões do TSE que no curso do pleito eleitoral ou
logo após o seu encerramento implicar mudança de jurisprudência não têm
aplicabilidade imediata ao caso concreto, somente terão eficácia sobre outros
casos do pleito eleitoral posterior. Acompanharam o voto do relator a ministra
Rosa Weber e os ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e Celso de Mello. Os
ministros Cezar Peluso e Marco Aurélio também deram provimento ao RE,
porém, em extensão diversa do relator.
O ministro Peluso
entendeu que deveria ser mantida a jurisprudência antiga do Supremo e do TSE,
segundo a qual prefeito reeleito em determinado município poderia candidatar-se
ao mesmo cargo em outro município, consideradas as condições previstas na CF. Para
ele, não há vedação constitucional ao chamado “prefeito itinerante”. “Não
existe nenhuma regra constitucional, de caráter geral, que proíba eleições
sucessivas para vários cargos”, ressaltou.
Nesse sentido
também votou o ministro Marco Aurélio. Ele adotou o entendimento de que “norma
geradora da inelegibilidade há de ser expressa, aprovada pelos integrantes do
Congresso Nacional”, observando que até o momento os parlamentares não
aprovaram essa espécie de vedação. O ministro acrescentou que os casos de inelegibilidade
estão previstos na Constituição Federal de forma exaustiva e não de forma
exemplificativa, “não sendo dado ao intérprete incluir restrição em preceito,
principalmente em preceito constitucional não contemplado”.
Divergência
Pelo desprovimento
do recurso apresentado pelo prefeito de Valença, votaram os ministros Joaquim
Barbosa, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Ricardo Lewandowski e Ayres Britto.
EC/AD
Processos relacionados
RE 637485 |
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