“O poder só é efetivado enquanto a palavra e o ato não se divorciam, quando as palavras não são vazias e os atos não são brutais, quando as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para revelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para criar relações e novas realidades.” (ARENDT, Hannah Condição Humana, 2007, p. 212)

Culpa concorrente impõe indenização a família de homem atropelado por trem

31/03/2015 - 08:00
DECISÃO

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou decisão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) para condenar a empresa América Latina Logística Malha Sul S/A a pagar indenização por danos materiais e morais às filhas de um homem que morreu atropelado por um trem da empresa.
A vítima estava deitada sobre os trilhos quando foi atropelada, mas a Turma entendeu que a concessionária teve culpa concorrente, pois caberia a ela cercar e fiscalizar a linha férrea para evitar acidentes, cuidado ainda mais necessário em locais urbanos e populosos.
Além disso, a Turma concluiu que o tribunal de origem não poderia ter decidido pela culpa exclusiva da vítima, pois não houve prova que demonstrasse a sua real intenção ao se deitar nos trilhos.

As filhas recorreram ao STJ depois de o TJPR manter a sentença que livrou a concessionária do dever de indenizar. Para elas, a empresa deveria responder civilmente pelo ocorrido, uma vez que é de sua responsabilidade sinalizar e conservar as vias férreas que administra. O acórdão do TJPR teria violado os artigos 10 do Decreto 2.089/63 e 588, parágrafo 5º, do Código Civil de 1916, que tratam do direito de tapagem.
Omissão
A maioria da Terceira Turma acompanhou o voto do ministro Moura Ribeiro, para quem a conduta da concessionária foi omissiva. Nesses casos, a responsabilidade civil do poder público ou de seu agente é subjetiva, ou seja, depende de dolo ou culpa, ao contrário da responsabilidade objetiva aplicável à situação de dano causado por ato comissivo.
Moura Ribeiro invocou a jurisprudência do STJ para afirmar que, no caso de atropelamento de pedestres em via férrea, fica configurada a concorrência de causas quando, de um lado, a concessionária é negligente em relação ao dever de cercar e fiscalizar os limites da via para prevenir acidentes; e, de outro, a vítima se mostra imprudente ao atravessar a via em local impróprio (REsp 1.210.064).
“A responsabilidade da concessionária de transporte ferroviário somente é elidida pela comprovação da culpa exclusiva da vítima”, disse o ministro. Segundo ele, culpa exclusiva e concorrente são inconfundíveis.
Pela metade
Na culpa exclusiva, explicou, “desaparece a relação de causalidade entre a conduta do agente e o evento danoso, dissolvendo-se a própria relação de responsabilidade”. Já na concorrente, “a responsabilidade se atenua em razão da concorrência de culpa, e a jurisprudência costuma condenar o agente causador do dano a reparar pela metade o prejuízo, cabendo à vítima arcar com a outra metade”.
Moura Ribeiro destacou que as instâncias ordinárias, responsáveis pela análise das provas, concluíram que o maquinista estava em velocidade inadequada para o local e que não havia sinalização para pedestres, embora aquele ponto fosse utilizado como passagem pelos moradores. Quanto à vítima, embora estivesse realmente deitada sobre os trilhos, não há informação de que estivesse embriagada.

O processo revela, segundo o ministro, a existência de culpa da vítima, paralelamente à culpa da concessionária. Combase nessas conclusões, a Turma condenou a empresa a pagar pela metade os danos materiais e morais, cujo valor ainda será apurado.

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