Como o divórcio e a
viuvez são associados ao mesmo fato – a dissolução do vínculo conjugal –, não
há justificativa para que apenas na hipótese de divórcio haja a autorização
para a retomada do nome de solteiro. Em respeito às normas constitucionais e ao
direito de personalidade próprio do viúvo ou viúva, que é pessoa distinta do
falecido, também deve ser garantido o restabelecimento do nome nos casos de
dissolução do casamento pela morte do cônjuge.
O entendimento foi
fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao autorizar
que uma viúva retome o seu nome de solteira. De forma unânime, o colegiado
concluiu que impedir a retomada do nome de solteiro na hipótese de falecimento
representaria grave violação aos direitos de personalidade, além de ir na
direção oposta ao movimento de diminuição da importância social de substituição
do patronímico por ocasião do casamento.
“A despeito da
inexistência de previsão legal específica acerca do tema (eis que a lei apenas
versa sobre uma hipótese de retomada do nome de solteiro, pelo divórcio) e da
existência de interesse público estatal na excepcionalidade da alteração do
nome civil (porque é elemento de constante identificação social), deve
sobressair, a toda evidência, o direito ao nome enquanto atributo dos direitos
da personalidade, de modo que este deverá ser o elemento preponderante na
perspectiva do intérprete do texto legal”, apontou a relatora do recurso
especial, ministra Nancy Andrighi.
Dívida moral
A viúva justificou
a necessidade do restabelecimento de seu nome original como forma de reparar
uma dívida moral com seu pai, que teria ficado decepcionado quando, por ocasião
do casamento, ela optou por incluir o sobrenome do marido.
O pedido foi
julgado improcedente em primeira e segunda instâncias. Em segundo grau, os
desembargadores entenderam que não havia erro ou situação excepcional que
justificasse a retificação do registro, e que, no caso de óbito do cônjuge, não
seria admissível a exclusão do patronímico oriundo do marido.
A ministra Nancy
Andrighi destacou que o direito ao nome é um dos elementos estruturantes dos
direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana. Mesmo assim,
lembrou, a tradição brasileira admite que uma pessoa, geralmente a mulher,
abdique de grande parte de seus direitos de personalidade para incorporar o
patronímico do cônjuge após o casamento, adquirindo um nome que não lhe
pertencia originalmente.
“Os motivos pelos
quais essa modificação foi – e ainda é – socialmente aceita com tamanha
naturalidade, aliás, são diversos: vão desde a histórica submissão patriarcal,
passam pela tentativa de agradar ao outro com quem se pretende conviver e
chegam, ainda, em uma deliberada intenção de adquirir um status social
diferenciado a partir da adoção do patronímico do cônjuge”, apontou a relatora.
Apesar dessa
característica, a ministra lembrou que a evolução da sociedade coloca a questão
nominativa na esfera da liberdade e da autonomia da vontade das partes,
justamente por se tratar de alteração substancial em um direito de personalidade.
Sociedade
conservadora
No caso dos autos,
a ministra observou que a alegação para a retomada do nome advém da necessidade
de reparação de uma dívida moral com o pai da viúva. Também lembrou que ambos
os cônjuges nasceram na década de 50, em pequenas cidades de Minas Gerais, e se
casaram na década de 80, situações que apontam para a predominância de uma
sociedade ainda bastante tradicional e conservadora em seus aspectos
familiares.
“Fica evidente,
pois, que descabe ao Poder Judiciário, em uma situação tão delicada e
particular, imiscuir-se na intimidade, na vida privada, nos valores e nas
crenças das pessoas, para dizer se a justificativa apresentada é ou não
plausível, sobretudo porque, se uma das funções precípuas do Poder Judiciário é
trazer a almejada pacificação social, a tutela não pode se prestar a trazer uma
eterna tormenta ao jurisdicionado”, afirmou a ministra.
No voto que foi
acompanhado pelo colegiado, a relatora ressaltou ainda que não só por uma
questão moral deveria ser autorizado o restabelecimento do nome de solteiro,
mas também em diversas outras situações, como por causa de trauma gerado em
virtude da morte, se a manutenção do nome anterior dificultar o desenvolvimento
de novo relacionamento ou por motivos de natureza profissional.
O
número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/Restabelecimento-do-nome-de-solteira-tamb%C3%A9m-%C3%A9-poss%C3%ADvel-com-a-morte-do-c%C3%B4njuge
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