Quinta-feira, 03 de maio de 2012
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF),
por maioria de votos, julgou improcedente o pedido feito na Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 3330, ajuizada pela Confederação Nacional dos
Estabelecimentos de Ensino (Confenen). A entidade questionava a Medida
Provisória nº 213/04, convertida na Lei nº 11.096/2005, que instituiu
o Programa Universidade para Todos (ProUni) e passou a regular a atuação
de entidades de assistência social no ensino superior.
O julgamento da ADI – à qual foi anexada a ADI
3314, proposta pelo partido DEM, por ter exatamente o mesmo objeto – foi
iniciado em 02 de abril de 2008, quando seu relator, ministro Ayres
Britto, se pronunciou pela improcedência do pedido. Naquele mesmo
julgamento, o Plenário, por unanimidade, não conheceu (decidiu não julgar o
mérito) da ADI 3319, por não reconhecer legitimidade ativa à Federação Nacional
dos Auditores Fiscais da Previdência Social (Fenafisp), autora dessa ADI,
para propor a ação. Suspenso naquela oportunidade, o julgamento foi
retomado hoje com a apresentação do voto-vista do ministro Joaquim Barbosa.
Alegações
Na ação, a Confenen sustentava que a MP e a lei em
que foi convertida ofendem o artigo 62 da Constituição Federal (CF) e, por via
de consequência, ao princípio da separação dos Poderes da República Federativa,
consagrado no artigo 2º da CF, caracterizando-se a usurpação legislativa pelo
chefe do Executivo, ante à ausência de “estado de necessidade
legislativo”, que autorizaria a utilização de Medida Provisória.
Sustentava, ainda, que os artigos 10 e 11 da
lei impugnada violam os artigos 146, II e 195, parágrafo 7º, da
Constituição, por invadirem seara reservada a lei complementar, ao
pretenderem “conceituar entidade beneficente de assistência social“, e ao
estabelecerem “requisitos para que a entidade possa ser considerada beneficente
de assistência social”.
A Procuradoria-Geral da República (PGR)
manifestou-se pela improcedência da ação. No mesmo sentido se pronunciou a
Advocacia-Geral da União (AGU), que defendeu a constitucionalidade da MP e da
lei impugnada.
Voto-vista
Em seu voto-vista, o ministro Joaquim Barbosa
refutou todos os argumentos da Confenen e do DEM. Em síntese, ele sustentou que
o ProUni é coerente com diversos dispositivos constitucionais que preveem a
redução de desigualdades sociais. Em favor desse argumento, ele citou dados do
Censo Anual de 2008 do Ministério da Educação (MEC) e do Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisa Educacional (Inep), segundo o qual havia, naquele ano, uma
oferta de 2,98 milhões de vagas nas universidades de todo o país, das quais
1,479 milhão estavam ociosas.
Ainda segundo aquele censo, a maior parte dessas
vagas ociosas se localizava em universidades privadas. E a causa disso era a
dificuldade financeira das famílias de pagar o estudo superior de seus filhos.
Assim, conforme o ministro, ao financiar a
bolsa total para alunos de famílias com renda até 1,5 salário mínimo e parcial
para aqueles egressos de famílias com renda de até 3 salários mínimos, o ProUni
representa um importante fator de inserção social. E essa afirmação, segundo
ele, é confirmada por uma pesquisa feita em março de 2009 pelo Ibope, segundo a
qual 56% dos alunos apoiados pelo ProUni já trabalhavam quando iniciaram seu
curso superior, mas seu nível de emprego aumentou para 80% após esse
patrocínio, contribuindo para melhorar a renda de suas famílias. Além disso,
conforme argumentou, o custo de cada bolsa do programa é inferior ao custo
por aluno em universidades públicas e, também, privadas.
Autonomia e igualdade
O ministro Joaquim Barbosa refutou, ainda, a
alegação de que o ProUni ofenderia o princípio da autonomia universitária,
previsto no artigo 207 da CF. Segundo ele, a adesão das universidades
ao programa é facultativa. “Nenhuma instituição particular de ensino
superior está obrigada a se vincular ou se manter vinculada ao ProUni, e a
adesão tem prazo de vigência de 10 anos, contado da data de sua assinatura”,
afirmou.
Por outro lado, de acordo com ele,
“há que se considerar que a autonomia universitária não é um objetivo que se
esgota em si próprio. Ela existe para que se atinjam outros objetivos, de
natureza educacional, social, cultural”. Ele refutou, também, a alegação de
ofensa ao princípio da igualdade, alegando que somente podem candidatar-se ao
ProUni aqueles candidatos aprovados em processo de seleção regular, disputado
com os demais alunos.
Livre iniciativa
O ministro rebateu, também, a alegação de que o
ProUni ofenderia o princípio da livre iniciativa (artigo 170, parágrafo único
da CF), que assegura a todos o livre exercício da atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previsto
em lei. Segundo ele, as universidades que aderirem ao ProUni não sofrem
qualquer restrição. E, considerando a ociosidade de vagas nessas instituições,
a lei pode até favorecer a manutenção de suas atividades, em razão dos
benefícios tributários que passarão a usufruir.
Por outro lado, ele destacou que a educação não é
uma mercadoria ou serviço sujeito às leis do mercado e sob a regência do princípio
da livre iniciativa. “Se a legislação franqueia a educação à exploração pela
iniciativa privada, essa só pode ocorrer se atendidos requisitos do artigo 209
da CF”, sustentou. Segundo ele, “não se trata, propriamente, de incidência pura
do princípio da livre iniciativa”.
Ministra Rosa Weber
Acompanhando o voto do relator, a ministra Rosa
Weber destacou que as alegações de violação aos princípios da isonomia,
autonomia universitária e livre iniciativa já foram abordados em seu voto na
ação julgada há duas semanas pelo STF, quanto ao critério de cotas da
Universidade de Brasília (ADPF 186).
Especificamente sobre a lei que instituiu o ProUni,
a ministra proferiu seu entendimento com relação ao dispositivo que dá
prioridade às empresas aderentes ao programa na distribuição dos recursos do
Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). Para a ministra
Rosa Weber, não há inconstitucionalidade, uma vez que o sistema apenas estimula
a adesão ao programa ao dar prioridade ao repasse dos recursos, não deixa de
fazer repasse às não aderentes, e cria mecanismos de estímulo à participação em
um importante programa de inclusão social.
Ministro Luiz Fux
O ministro Luiz Fux votou hoje pela
constitucionalidade do programa. “O ProUni representa uma política pública
federal, subsidiado com recursos federais, de adesão voluntária, por isso não
viola a livre iniciativa nem o pacto federativo. É um exemplo eloquente de
fomento público de atividades particulares relevantes”, disse. O ministro
rebateu o argumento de que o programa fere a isonomia ao repassar verbas para
universidades privadas que instituírem ações afirmativas, reservando bolsas
para alunos que cursaram o ensino médio em escolas públicas, sendo que boa
parte delas deve ser concedida a negros, índios e portadores de necessidades
especiais.
“A isonomia, no caso concreto, reclama tratamento
isonômico, tratando igual os iguais e desigualmente os desiguais. Um dos
subprincípios da isonomia na Constituição Federal, no seu artigo 206, é
garantir a igualdade de acesso à educação”, afirmou, lembrando que há um
paradoxo no Brasil no qual alunos de escolas públicas têm dificuldade de acesso
às universidades federais e estaduais, que são as melhores do país, por conta
da baixa qualidade dos colégios públicos. O ministro Luiz Fux também sustentou
que a lei que criou o ProUni não limitou o poder estatal de tributar ao
conceder isenção às entidades que aderem ao programa. “A lei apenas estabelece
critérios para que as entidades possam se enquadrar no programa. Isso nada tem
a ver com o poder de tributar”, apontou. O ministro Cezar Peluso também
acompanhou o relator.
Ministro Gilmar Mendes
Ao acompanhar o voto do relator das ADIs 3330 e
3314, o ministro Gilmar Mendes afirmou que a sistemática adotada pelo ProUni para
fomentar a concessão de bolsas de estudo por parte de instituições privadas de
educação superior mediante o oferecimento, em contrapartida, de isenção de
alguns tributos, é, em sua opinião, um modelo extremamente engenhoso que
favorece mais de um milhão de estudantes, e que deveria ser estendido a outros
setores.
Para o ministro, o ProUni é bem-sucedido muito
em razão de seu mecanismo de fiscalização, que é “bastante simples, quase
documental”, na medida em que dispensa a atuação de fiscais para impedir fraudes.
“É um modelo institucional digno de encômios [elogios] porque todos nós sabemos
da dificuldade de se fazer um controle dessas entidades. E é um modelo que pode
se expandir para outras áreas, como a saúde”, afirmou.
O ministro Gilmar Mendes também teceu elogios aos
critérios para a concessão de bolsas com base na renda, e não na cor da pele. O
programa é dirigido aos estudantes egressos do ensino médio da rede pública ou
da rede particular na condição de bolsistas integrais, com renda per
capita familiar máxima de três salários mínimos. “A lei do ProUni, em
verdade, estabelece o critério de renda do aluno como requisito essencial para
a concessão dessas bolsas”, finalizou.
Divergência
O ministro Marco Aurélio foi o único a divergir da
maioria e votar contra a norma que instituiu o ProUni. “O meu compromisso não é
com o politicamente correto. É com o politicamente correto se estiver, sob
a minha ótica, segundo a minha ciência e consciência, harmônico com a Carta da
República”, disse.
Para o ministro Marco Aurélio, o projeto de lei
originalmente apresentado pelo Executivo ao Congresso Nacional com o intuito de
criar o ProUni foi atropelado pela MP. Ainda segundo ele, a medida
provisória contém diversos vícios, como, por exemplo, não respeitar os
requisitos de urgência e relevância previstos na Constituição Federal, e
regular matéria tributária (prevê isenção fiscal às universidades que aderirem
ao ProUni), o que somente pode ser feito por meio de lei complementar.
“O Poder Executivo abandonou o projeto tendo em
conta a polivalência que ganhou a medida provisória e potencializando
requisitos (da urgência e relevância) editou a medida provisória”, ponderou.
Ele observou ainda que pouco importa que a MP tenha sido convertida em lei. “O
vício originário quanto à edição da medida provisória contamina a lei de
conversão. A lei de conversão, em síntese, é válida se válida se mostrar a
medida provisória”, concluiu ao citar o jurista Celso Antonio Bandeira de
Mello.
O ministro Marco Aurélio também questionou o fato
de a lei prever sanções, a serem aplicadas pelo Ministério da Educação, para
instituições que descumprirem as obrigações assumidas no termo de adesão ao
ProUni. “Sob esse ângulo, se tem um maltrato à autonomia universitária”,
afirmou. Ao final de seu voto, o ministro defendeu que o Estado invista em
universidades públicas, ao invés de “compelir a iniciativa privada fazer o que
o próprio Estado deveria fazer”.
Redação
Passando para conhecer o blog, muito bom!
ResponderExcluirObrigado Matheus, sempre der um passadinha por esta página
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