Luiz Fux se diz impedido, mas atua em casos de advogado que emprega a filha
Ministro do STF ignora declaração de 1º de abril de 2011 na qual
prometia não atuar em processos que tivessem o amigo Sergio Bermudes como parte
BRASÍLIA - Ignorando documento de sua
própria autoria em que afirma estar impedido de julgar processos do escritório
do advogado Sergio Bermudes, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz
Fux relatou três casos e participou de julgamentos de pelo menos outros três de
interesse do grupo, conforme levantamento feito pelo Estado em documentos
oficiais da Corte. A filha de Fux, Marianna, é uma das advogadas do escritório.
Os processos pesquisados têm como
advogado principal o próprio Sérgio Bermudes. Em dois desses julgamentos, na 2ª
Turma do STF, Fux acompanhou o voto de colegas a favor dos interesses
defendidos por Bermudes. Em outras duas ocasiões as decisões colegiadas foram
contrárias aos interesses dos clientes do advogado. Ele comandou ainda a análise
de três processos como relator.
A relação de Fux e Bermudes ganhou
destaque na semana passada quando o advogado anunciou que bancaria uma festa
para comemorar os 60 anos do ministro, evento que reuniria centenas de
magistrados, advogados e políticos, mas que acabou cancelado. Um dos convidados
foi o governador do Rio, Sérgio Cabral. Caberá a ele a escolha de novos
desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado. A filha de Fux é uma das
candidatas.
Memorando. No dia 1.º de abril de
2011, o chefe de gabinete de Fux, Nicolao Salvador, encaminhou memorando à
Secretaria Judiciário do Supremo para informar que o ministro estaria impedido
de julgar processos do escritório de Bermudes e de outros dois escritórios e
referentes à Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Os processos são distribuídos
livremente e por sorteio entre os ministros da Corte. Caso o ministro sorteado
para relatar o caso se julgue impedido ou se considere suspeito por questões de
foro íntimo, o processo é redistribuído. Em dois casos, o processo foi
encaminhado ao gabinete de Fux. Em vez de se julgar impedido, o ministro seguiu
adiante com os processos depois da data do memorando.
Em agosto de 2011, Luiz Fux
determinou, em despacho, que um processo movido contra um cliente de Bermudes
aguardasse julgamento de recurso especial. Em setembro de 2011 negou seguimento
a um agravo, numa decisão contrária aos interesses do escritório de Bermudes. O
terceiro processo chegou na semana passada ao gabinete do ministro e não houve
nenhuma decisão.
Em outros quatro casos representados
diretamente por Bermudes, Fux participou normalmente do julgamento na 2.ª
Turma, como atestam os acórdãos. Em três desses casos, as decisões foram
unânimes (uma a favor dos interesses do escritório de Bermudes, uma contra e
uma parcial). Em nenhum desses casos, o ministro Luiz Fux fez menção de não
participar.
O advogado Sérgio Bermudes destaca
que a legislação não obriga o ministro a se afastar dos processos. "Ele
(Fux) não pode julgar os processos da filha dele. Ele se dá por impedido nos
nossos processos, mas ele não está impedido pela lei", afirmou Bermudes.
Ele observou que há 115 advogados atuando em seu escritório. "Não teria
como ter impedimento para todos, seria um absurdo", argumentou.
Gilmar Mendes. Além de Fux, o
ministro Gilmar Mendes também tem parente que trabalha com Bermudes.
Guiomar Feitosa Lima Mendes é casada
com o ministro e é uma das advogadas do escritório. Ao contrário de Fux, Gilmar
Mendes não se julga impedido ou suspeito de participar do julgamento de
processos do escritório. Gilmar Mendes não quis se manifestar sobre o tema.
Recentemente, o presidente do STF,
Joaquim Barbosa, criticou o "conluio" entre advogados e magistrados.
Barbosa é próximo de Fux, tendo inclusive o convidado para discursar em sua
posse na presidência do STF.
José Dirceu. Fux enfrenta críticas
internas em razão dos apoios que buscou para ser indicado ao Supremo. Em
entrevista à Folha de S.Paulo, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu no
governo Lula afirmou que foi assediado por Fux quando ele tentava viabilizar
sua indicação para o Supremo. Em resposta, o ministro disse que procurou Dirceu
na época porque ele era influente no governo e que não se lembrava que o
ex-ministro era réu da ação do mensalão.
FONTE: JORNAL ESTADÃO
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