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Falta de pagamento não autoriza loja a pedir busca e apreensão de bens financiados


12/06/2013 - 09h05
DECISÃO

Loja varejista não tem legitimidade para ajuizar ação de busca e apreensão de bens como geladeiras, fogões e televisores adquiridos em contrato de alienação fiduciária por falta de pagamento das prestações do financiamento. Somente instituições financeiras ou de pessoa jurídica de direito público titular de créditos fiscais e previdenciários podem propor essas ações.

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve extintos dois processos em que as Lojas Becker Ltda. pretendia promover a busca e apreensão de produtos comprados por clientes inadimplentes. Em um caso, queria de volta uma geladeira. No outro, buscava aparelhos de som, antena parabólica, colchões e cantoneiras.

Os objetos foram adquiridos por meio de financiamento estabelecido em contrato de alienação fiduciária. Nesse negócio, o comprador (fiduciante) transfere ao credor (fiduciário) a propriedade e posse indireta do bem, como garantia da dívida, que termina com a quitação do financiamento.

Natureza do bem

O ministro Luis Felipe Salomão, relator dos recursos da loja, explicou que é preciso definir a natureza do bem para verificar em qual legislação a relação jurídica se enquadra.

Sendo bem móvel fungível (pode ser substituído por outro do mesmo gênero), e se o credor fiduciário for pessoa física ou jurídica, aplica-se o Código Civil (CC). Quando o bem é fungível ou infungível (impossível de ser substituído devido à sua individuação) e o credor é instituição financeira, incidem as Leis 4.728/65 e 10.931/04 e o Decreto-Lei 911/69.

Nos casos julgados, o ministro entendeu que a indicação de móveis e eletrodomésticos – a princípio fungíveis – em contrato de alienação fiduciária pode torná-los infungíveis. Assim, pode haver enquadramento tanto no CC quanto no Decreto-Lei 911.

Legitimidade

O relator ressaltou que, até a edição do CC de 2002, somente as instituições financeiras e as entidades estatais e paraestatais podiam celebrar contrato de alienação fiduciária e apenas as operações previstas especificamente em lei poderiam ser garantidas pela propriedade fiduciária. Isso porque os direitos reais somente podem ser criados por lei, jamais pela vontade das partes.

“O Código Civil de 2002 estendeu o campo material de aplicação dessa garantia real às pessoas jurídicas e naturais indistintamente, uma vez que não impôs nenhuma restrição à pessoa do credor, consoante se dessume da leitura atenta dos artigos 1.361 a 1.368”, explicou Salomão.

Nos contratos de crédito direto ao consumidor que motivaram as ações, as Lojas Becker figuram como vendedora e os compradores como clientes. No espaço destinado à identificação do financiador constava apenas “instituição financeira”, sem assinatura desse agente no contrato. A falta de uma instituição financeira no negócio levou o ministro à conclusão de que o caso não se enquadra no Decreto-Lei 911. Aplica-se, por tanto, o Código Civil.

De acordo com o ministro, por disposição legal expressa, “é vedada a utilização do rito processual da busca e apreensão, tal qual disciplinado pelo Decreto-Lei 911, ao credor fiduciário que não revista a condição de instituição financeira ou de pessoa jurídica de direito público titular de créditos fiscais e previdenciários”.

Seguindo o voto do relator, a Turma negou o recurso por considerar que as Lojas Becker não têm legitimidade para ajuizar ação de busca e apreensão prevista no Decreto-Lei 911.

Fundamento diverso

As decisões da Quarta de Turma mantêm acórdãos do Tribunal de Justiça do Rio Grande Sul, que confirmou a extinção dos processos sem julgamento de mérito. Contudo, o STJ adotou outro fundamento.

No julgamento da apelação, o tribunal gaúcho negou os pedidos de busca e apreensão das Lojas Becker porque não havia assentamento do contrato no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, necessário para constituição da propriedade fiduciária. Assim, negou o recurso de apelação contra a sentença que julgou o processo extinto.

Sem se pronunciar quanto à necessidade do registro, os ministros do STJ analisaram a questão sob outro enfoque, que antecede qualquer discussão: a legitimidade ativa da demanda. 

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