ESPECIAL
11/03/2018 06:52
O regime geral da
Previdência Social oferece um tratamento diferenciado aos trabalhadores que
exercem atividade rural, em regime de economia familiar e sem empregados
permanentes. Regulada pelo artigo 48, parágrafos 1º e 2º, e pelo artigo 143 da Lei 8.213/91, a concessão da
aposentadoria rural, entretanto, nem sempre se dá de forma pacífica. Em muitos
casos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) precisa intervir para que a norma
infraconstitucional seja cumprida.
Todo trabalhador
que comprove o exercício da atividade rural ou de pescador, de forma individual
ou com auxílio da família, por 15 anos, além da idade mínima (55 anos para
mulher e 60 para homem), tem direito de solicitar o benefício, que é de um
salário mínimo.
Trabalho infantil
Apesar de a maioria
dos trabalhadores rurais começar a trabalhar ainda na infância, não é todo o
período que pode ser usado para o cálculo dos 15 anos exigidos. De acordo com a
jurisprudência do STJ, “comprovada a atividade rural do trabalhador menor de 14
anos, em regime de economia familiar, esse tempo deve ser computado para fins
previdenciários. ”
Por aplicação do
princípio da universalidade da cobertura da seguridade social, o entendimento
da corte é de que a proibição do trabalho ao menor de 14 anos foi estabelecida
em benefício do menor e não em seu prejuízo. Dessa forma, no julgamento
do REsp 573.556, a Quinta Turma do STJ admitiu o cômputo do
período de serviço rural prestado a partir dos 12 anos como tempo de
contribuição.
Tamanho da
propriedade
O STJ também já se
pronunciou a respeito da polêmica sobre a dimensão do imóvel rural, isto é, se
ela descaracteriza ou não o regime de economia familiar. No julgamento do REsp 1.532.010, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região
(TRF3) considerou que não foi devidamente comprovado o exercício da atividade
rural, em regime de economia familiar, em razão do tamanho da propriedade.
Segundo o acórdão,
“a extensão da propriedade, descrita na exordial (74,1 hectares), nas certidões
(74,1 e 36,3 hectares), nas declarações cadastrais de produtor (36,3 e 46,4
hectares), bem como na escritura pública de divisão amigável (70,6286
hectares), descaracterizam a alegada atividade como pequeno produtor rural em
regime de economia familiar”.
A decisão foi
reformada no STJ. De acordo com o relator, ministro Sérgio Kukina, o
entendimento do TRF3 contrariou a jurisprudência do tribunal, segundo a qual o
tamanho da propriedade, por si só, não descaracteriza o regime de economia
familiar, quando preenchidos os demais requisitos necessários à sua
configuração, que são a ausência de empregados permanentes e a mútua
dependência e colaboração do núcleo familiar nas lides no campo.
Aposentadoria
híbrida
A aposentadoria
rural híbrida é o benefício que considera tanto o tempo de trabalho urbano
quanto o tempo rural. No STJ, A Segunda Turma manteve decisão do Tribunal
Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que concedeu a uma mulher o benefício da
aposentadoria híbrida ao permitir que o período de atividade rural fosse somado
ao do trabalho urbano.
Para o Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS), a aposentadoria foi concedida de forma
inadequada e sem fonte de custeio, mas o relator, ministro Mauro Campbell
Marques, não acolheu a argumentação.
Segundo ele, a Lei
11.718/08, que deu nova redação ao artigo 11 e ao artigo 48 da Lei 8.213/91, criou a possibilidade de
mesclar os requisitos das aposentadorias por idade urbana e rural, sem o
direito à redução de cinco anos na idade exigida para a concessão.
“A Lei 11.718/08,
em vigor desde 23/6/2008, deu nova redação aos artigos 11 e 48 da Lei 8.213/91,
acrescentando ao artigo 48 os parágrafos 3º e 4º, criando a possibilidade de
concessão de aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais que se enquadrem
nas categorias de segurado empregado, contribuinte individual, trabalhador
avulso e segurado especial, com observância da idade de 65 anos para o homem e
60 anos para a mulher”, explicou o ministro.
Ele observou que
existem inúmeros segurados da Previdência Social que trabalharam no meio rural
por longo tempo e, posteriormente, buscaram melhores condições de vida na área
urbana. Segundo ele, esse passado de trabalho rural não pode ser ignorado.
“No período como
trabalhador rural, diante da ausência de contribuições previdenciárias, deve
ser considerado para fins de cálculo atuarial o valor do salário mínimo. Esta,
no meu modo de sentir, é a inteligência do parágrafo 4º do artigo 48 da Lei de
Benefícios”, argumentou o ministro (REsp 1.367.479).
Prova testemunhal
No site do INSS,
é possível conferir alguns exemplos de documentos aptos a comprovar a atividade
rural do trabalhador para a concessão da aposentadoria rural, como contrato de
arrendamento, notas fiscais e título de eleitor.
Antes do julgamento
do REsp 1.348.633, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 638),
alguns tribunais consideravam como trabalho rural apenas o período posterior à
data do documento mais antigo apresentado, mas a Primeira Seção do STJ
modificou esse entendimento e firmou a tese de que é possível comprovar o
período de trabalho rural anterior ao do registro material mais antigo, por
meio de testemunhas.
O colegiado
reconheceu que apesar de a Súmula 149 do STJ estabelecer que “a prova
exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola para
efeito da obtenção de benefício previdenciário”, é possível, mediante
apresentação de um início de prova material, o reconhecimento do tempo de
serviço rural, corroborado por testemunhos idôneos.
Imediatamente
anterior
Outra tese firmada
pela Primeira Seção em recurso repetitivo (REsp 1.354.908) foi a de que “o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por
idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício” (Tema 642).
No caso apreciado,
uma segurada ajuizou ação contra o INSS para garantir o recebimento do
benefício da aposentadoria rural por idade. A sentença, confirmada no acórdão
de apelação, julgou o pedido procedente.
Para o tribunal de
origem, a segurada reuniu todos os requisitos legais para concessão do
benefício, assegurando ter sido demonstrado o exercício da atividade rural por
início de prova material e testemunhos, no período imediatamente anterior ao
requerimento.
O INSS, então,
interpôs recurso especial sob o fundamento de que não foi apresentada prova
documental de que a segurada exercia o trabalho na condição de rurícola no
período imediatamente anterior ao requerimento do benefício.
Trabalho urbano
De acordo com o
processo, a segurada, nascida em 1952, trabalhou na lavoura desde os seus 14
anos de idade. Em 1980, o marido ingressou como servidor público de uma
prefeitura e ela continuou a exercer suas atividades rurais, tendo apenas
exercido atividades urbanas entre os períodos sazonais de safras, como
empregada doméstica.
Foram reconhecidos
como início de prova material pelo tribunal de origem a certidão de nascimento
da segurada, a certidão de casamento, a certidão de nascimento dos filhos, a
ficha do sindicato dos trabalhadores rurais, a escritura pública de propriedade
rural e a carteira de trabalho.
O fato de a segurada
ter trabalhado como empregada doméstica no período da entressafra não
descaracteriza sua condição de segurada especial, pois a Lei 8.213/91 garante o
cômputo do período em que o trabalhador rural se encontre em período de
entressafra ou do defeso, não superior a 120 dias.
No caso julgado,
entretanto, a concessão da aposentadoria foi prejudicada porque ela estava
trabalhando como doméstica quando completou a idade mínima. A jurisprudência do
STJ exige que o conjunto probatório da atividade rural comprove a carência no
período imediatamente anterior ao requerimento.
“O artigo 143 da
Lei 8.213/91 contém comando de que a prova do labor rural deverá ser no período
imediatamente anterior ao requerimento. O termo imediatamente pretende evitar
que pessoas que há muito tempo se afastaram das lides campesinas obtenham a
aposentadoria por idade rural. A norma visa agraciar exclusivamente aqueles que
se encontram, verdadeiramente, sob a regra de transição, isto é, trabalhando em
atividade rural, quando do preenchimento da idade”, explicou o relator,
ministro Mauro Campbell Marques.
Destaques de hoje
Esta notícia
refere-se ao(s) processo(s):REsp 573556REsp 1532010REsp 1367479REsp 1348633REsp 1354908
http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/Aposentadoria-do-trabalhador-rural:-requisitos,-possibilidades-e-impedimentos
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