“O poder só é efetivado enquanto a palavra e o ato não se divorciam, quando as palavras não são vazias e os atos não são brutais, quando as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para revelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para criar relações e novas realidades.” (ARENDT, Hannah Condição Humana, 2007, p. 212)

STF dá início a julgamento sobre ensino domiciliar


Julgamento foi suspenso após manifestação das partes e do voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, e deve ser retomado na sessão plenária do dia 12.
06/09/2018 19h50 
Nesta quinta-feira (6), o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 888815, que discute se o ensino domiciliar (homeschooling) pode ser considerado meio lícito de cumprimento, pela família, do dever de prover a educação dos filhos. Para o relator da matéria, ministro Luís Roberto Barroso, o ensino domiciliar formal é compatível com a Constituição Federal. A análise do RE deverá ser retomada na sessão da próxima quarta-feira (12).

O recurso, que teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual do STF em junho de 2016, tem origem em mandado de segurança impetrado pelos pais de uma menina, então com 11 anos, contra ato da secretária de Educação do Município de Canela (RS), que negou pedido para que a criança fosse educada em casa e orientou-os a fazer matrícula na rede regular de ensino, onde até então havia estudado.
Relator
No início do voto, o relator explicou que o homeschooling é a prática pela qual os pais ou responsáveis assumem a responsabilidade pela escolarização formal da criança e deixam de delegá-la às instituições formais de ensino. As aulas podem ser ministradas pelos próprios pais ou por professores particulares contratados, sendo que a principal característica é a direção e responsabilidade pelo ensino ser dos pais, que optam por fazê-lo em casa.
O ministro votou pelo provimento do recurso extraordinário para garantir o direito à educação em casa, respeitados os parâmetros apresentados no voto. Ele explicou que a discussão não está em saber se o ensino domiciliar é melhor ou pior, mas envolve o “respeito às opções e circunstâncias de quem prefere um caminho diferente”. Segundo o relator, as motivações dos pais que optam pelo ensino domiciliar demonstra a preocupação genuína com o desenvolvimento educacional pleno e adequado dos seus filhos. “Nenhum pai ou mãe faz essa opção, que é muito mais trabalhosa, por preguiça ou capricho”, afirmou, considerando haver razões relevantes e legítimas para que essa opção possa ser respeitada pela Constituição.
O ministro também observou que a Constituição Federal não trata dessa questão de forma específica, mas refere-se apenas ao ensino oficial, o que leva a diversas interpretações. Ele expôs o panorama mundial do tratamento da matéria, apontando os países que efetivamente permitem a educação domiciliar, como é o caso do Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia.
Em seguida, rebateu todos os argumentos contrários à prática do homeschooling. De acordo com ele, a escolarização formal em instituição oficial não é o único padrão pedagógico autorizado pela CF, a qual, sob a ótica do relator, não exclui outros mecanismos a serem utilizados pelos pais. Quanto ao argumento de que o ensino domiciliar caracteriza crime de abandono intelectual, o ministro salientou que nessa prática os pais estão provendo a educação, mas por meio de um método diferente.
Ao afastar a ideia de que as famílias poderiam deixar os filhos fora da escola por irresponsabilidade ou para que eles trabalhassem, o ministro Luís Roberto Barroso destacou que as crianças em ensino domiciliar serão submetidas a exames periódicos. Ele também afirmou que a socialização é importante, mas considerou que as crianças podem conviver com outras em locais como igrejas, clubes desportivos e parques públicos.
O ministro citou vários princípios constitucionais importantes, entre eles os contidos nos artigos 205, 206 e 229, a serem aplicados no sentido do melhor interesse da criança e ressaltou que a Constituição coloca a família na frente do Estado no dever de prover educação. Para o relator, a ensino domiciliar é uma opção não vedada pela Constituição brasileira “e a meu ver é expressamente ressalvada por atos internacionais relevantes como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e pelo Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos Sociais e Culturais”.
Tese
Em seu voto, o relator propôs a seguinte tese de repercussão geral: “É constitucional a prática de ensino domiciliar (homeschooling) a crianças e adolescentes em virtude da sua compatibilidade com as finalidades e os valores da educação infanto-juvenil, expressos na Constituição de 1988.”
Parâmetros
Por fim, o ministro Luís Roberto Barroso propôs algumas regras de regulamentação da matéria, com base em limites constitucionais. Ao fixar a tese de repercussão geral, o ministro destacou que os pais devem notificar as Secretarias Municipais de Educação sobre a opção pelo ensino domiciliar; as crianças devem ser submetidas a avaliações periódicas; os dados podem ser compartilhados com outras autoridades, como Ministério Público; e se for comprovada a deficiência na formação acadêmica, os pais serão notificados e, caso não haja melhoria no rendimento da criança ou do adolescente, os órgãos públicos competentes determinarem a matrícula nos estabelecimentos regulares.
EC/CR
http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=389073

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